STF mantém tornozeleira eletrônica para Bolsonaro por 4 a 1; Fux diverge

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou, por quatro votos a um, a decisão do ministro Alexandre de Moraes que impôs tornozeleira eletrônica e outras restrições ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A sessão extraordinária ocorreu nesta segunda-feira (22), durante o recesso do Judiciário, e terminou com o ministro Luiz Fux isolado na divergência.
Acompanhando Moraes, votaram os ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. O colegiado analisou pedido da Procuradoria-Geral da República para adoção de medidas cautelares sob o argumento de risco de fuga e tentativa de obstrução de investigações que apuram a suposta participação do ex-chefe do Executivo em trama golpista de 2022.
No voto vencedor, Moraes afirmou que publicações de Jair e do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), além de declarações do ex-presidente norte-americano Donald Trump, revelam “atos executórios” e “confissões” que justificam a cautelar. Segundo o relator, há indícios de coação no curso do processo, obstrução de investigação envolvendo organização criminosa e atentado à soberania nacional.
Dino foi o primeiro a aderir ao entendimento e destacou a reação do governo dos Estados Unidos, que anunciou sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros e restrições de entrada contra ministros do STF. Para o magistrado, trata-se de “estratégia de retaliação política” destinada a pressionar a Corte a arquivar a Ação Penal 2668, que trata do núcleo central da suposta tentativa de golpe.
Em voto solitário, Fux avaliou que as medidas afetam de forma “desproporcional” os direitos fundamentais do investigado. O ministro considerou inexistir, no momento, demonstração concreta e individualizada que justifique restrições à liberdade de locomoção e de expressão de Bolsonaro. Ele também registrou que, na visão dele, as cautelares podem ser revistas a qualquer tempo, caso surjam fatos novos.
As determinações confirmadas incluem o uso permanente de tornozeleira eletrônica, proibição de sair de casa durante a noite e aos fins de semana, vedação de contato com outros investigados ou representantes de embaixadas estrangeiras e bloqueio de perfis em redes sociais. A ordem se estende a conteúdos veiculados por terceiros, como entrevistas transmitidas on-line.
A Polícia Federal executou, na sexta-feira (18), mandado de busca e apreensão na residência de Bolsonaro e na sede do PL. Os agentes recolheram cerca de US$ 14 mil em espécie, segundo relatório parcial da corporação. A operação foi autorizada por Moraes e ocorreu poucas horas antes da convocação da sessão virtual que referendou as cautelares.
O processo tramita sob sigilo e teve origem em representação da PF. O caso ficou com Moraes porque ele já relata inquérito contra Eduardo Bolsonaro, que investiga possível coação, obstrução de investigação penal e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. De acordo com a decisão, pai e filho teriam atuado para “induzir, instigar ou auxiliar” governo estrangeiro em atos hostis ao Brasil, buscando a extinção da ação penal em andamento no Supremo.
A defesa de Bolsonaro classificou as restrições como “surpreendentes e indignas” e declarou que o ex-presidente sempre cumpriu determinações judiciais. Apesar da manifestação, o colegiado manteve integralmente o conjunto de medidas proposto pela PGR e endossado pelo relator.
Paralelamente, o Departamento de Estado dos Estados Unidos anunciou, na mesma data da operação policial, a revogação de vistos de Moraes, familiares e aliados no tribunal. Informações de bastidores indicam que a medida não alcançou Fux, Kassio Nunes Marques e André Mendonça. O governo norte-americano também abriu investigação comercial que resultou na sobretaxa de produtos brasileiros.
A permanência de Bolsonaro sob monitoramento ocorre às vésperas de etapa decisiva da ação penal que pode levar à decretação de prisão preventiva. O calendário do processo prevê o encerramento da fase de instrução ainda neste semestre, com posterior julgamento do mérito pelas turmas do Supremo. Enquanto isso, eventuais violações às cautelares poderão gerar novas sanções, incluindo recolhimento domiciliar integral.
Com a votação encerrada, o STF comunicou a decisão à Polícia Federal para que sejam providenciadas a instalação da tornozeleira e a fiscalização dos demais constrangimentos. O tribunal também expediu ofícios às plataformas digitais avisando sobre a proibição de conteúdos relacionados ao ex-mandatário, sob pena de multa diária.
O Palácio do Planalto não comentou a decisão. No Congresso, aliados de Bolsonaro criticaram a maioria da Corte, enquanto parlamentares da base governista defenderam a atuação do Supremo. Até o fim do recesso, novas sessões extraordinárias poderão ser convocadas caso haja recurso da defesa ou requerimento do Ministério Público.
Bolsonaro segue respondendo a outros inquéritos, entre eles o que investiga suposta tentativa de introduzir joias sauditas no país e o que apura possível fraude em cartão de vacinação. Todos os procedimentos correm em paralelo à ação penal sobre a trama golpista, que se tornou o principal foco de atenção do ex-presidente e de seus advogados.