Mudança no foro especial não altera ação contra Bolsonaro, apontam juristas

Especialistas em direito constitucional e penal afirmam que a iniciativa discutida no Congresso para restringir investigações contra parlamentares e redefinir o foro especial não interferirá no processo que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF).
Proposta em debate no Legislativo
Após a ocupação de cerca de 30 horas no plenário da Câmara por apoiadores de Bolsonaro, deputados e senadores passaram a articular um texto que condiciona a abertura de inquéritos a autorização prévia do Parlamento. A ideia inclui ainda a criação de três instâncias para julgamento de parlamentares: início nos Tribunais Regionais Federais, possibilidade de recurso ao Superior Tribunal de Justiça e, por fim, ao STF.
O advogado e professor Miguel Godoy vê inconstitucionalidade na exigência de aval legislativo, por considerar que viola o princípio da isonomia. Para ele, o foro para presidentes de Poderes deveria permanecer no STF, enquanto os demais ocupantes de cargos eletivos seriam julgados na Justiça comum.
Sem impacto na ação sobre a trama golpista
Juristas consultados destacam que o processo em que Bolsonaro é réu por suposta participação em tentativa de golpe está na fase de alegações finais, etapa posterior à instrução. Nesse ponto, qualquer alteração na regra de competência não retroagiria para modificar o órgão julgador.
O professor Luiz Fernando Esteves, do Insper, acrescenta que a competência do STF no caso decorre de conexão com outros inquéritos, não apenas do cargo de presidente que Bolsonaro ocupava. Ele alerta que inserir dispositivo para deslocar o processo poderia ferir a separação de Poderes.

Riscos de impunidade e retrocesso institucional
Alberto Zacharias Toron, especialista em processo penal, considera legítima a revisão do foro especial por meio de emenda constitucional, mas vê motivação política na proposta atual, direcionada a escapar de decisões mais rígidas do Supremo. Para o criminalista, transferir todos os casos para tribunais regionais ignora a natureza dos crimes, enquanto exigir permissão parlamentar para investigações criaria barreiras à responsabilização de congressistas.
Os juristas convergem ao avaliar que a tentativa de blindagem não alcança Bolsonaro e poderia comprometer a credibilidade das instituições, ao estabelecer tratamento privilegiado para membros do Legislativo. Assim, mesmo que o projeto avance, a ação relacionada à suposta trama golpista seguirá sob análise do STF, sem alteração prática decorrente da mudança proposta.