São Paulo – Desde que a lei que tipifica a violência política de gênero entrou em vigor, em agosto de 2021, o país contabilizou 62 ações penais até junho de 2025, revela relatório do Instituto Alziras divulgado nesta quarta-feira (27).
O levantamento avaliou os primeiros quatro anos da legislação e combinou dados do Grupo de Trabalho sobre Violência Política de Gênero do Ministério Público Federal (MPF), consultas nos sistemas da Justiça Eleitoral e pedidos de informação aos 27 Ministérios Públicos estaduais.
Baixa judicialização
Dos 245 casos identificados pelo MPF no período, apenas 11% resultaram em processos judiciais. Para Michelle Ferreti, diretora do Instituto Alziras, a proporção reflete subnotificação e arquivamentos na fase de inquérito. “É um universo muito pequeno diante da quantidade de casos que se tem notícia”, afirma.
Perfil dos agressores
Homens representam 85% dos réus, e 60% exercem cargos públicos – sobretudo vereadores (40%). Cidadãos sem mandato respondem por outros 40% dos autores. Entre os 44 agressores filiados a partidos, o PL lidera com 11%, seguido por União Brasil e MDB, ambos com 7%. Siglas de esquerda, como PT e PSB, também aparecem, cada uma com 3%.
Quem são as vítimas
Mais da metade das ações (55%) envolve vereadoras; candidatas e deputadas estaduais concentram 16% cada. O PT reúne a maior parcela de vítimas (23%), à frente de PSOL e PSD, com 10% cada. Ferreti observa que a presença de mulheres de partidos conservadores entre as vítimas indica “disputa pelo espaço político com viés de gênero, além das diferenças ideológicas”.
Ambiente dos ataques
O relatório mostra que 54% dos episódios ocorreram em ambientes físicos, principalmente câmaras municipais, enquanto 40% se deram online e 6% combinaram ambos. Para Clarice Tavares, pesquisadora do InternetLab, a violência digital “é tão real quanto a presencial” e pode dissuadir mulheres de concorrer a cargos eletivos.
Processos e punições
Dos 62 processos mapeados, 12 foram encerrados sem condenação. Em 16% dos casos, houve suspensão condicional do processo, medida que interrompe a ação por até quatro anos mediante cumprimento de condições fixadas pelo juiz. A professora de direito penal Daniela Portugal avalia que ainda é cedo para apontar impunidade, mas reconhece obstáculos para o reconhecimento do crime e seletividade na aplicação da lei.

O estudo também destaca que as agressões verbalmente registradas variam de xingamentos à ameaça de morte, com maior gravidade quando dirigidas a mulheres negras, indígenas e LGBTQIAP+. Segundo Ferreti, barreiras econômicas e falta de capital político tornam mais difícil o acesso dessas mulheres à Justiça.
Em síntese, o relatório aponta que, embora a legislação tenha criado tipificação específica, a judicialização segue restrita e as punições, raras, indicando desafios para tornar efetiva a proteção das mulheres no exercício da política.
Com informações de Folha de S.Paulo
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