Julgamento de Bolsonaro e quatro oficiais generais inaugura nova postura sobre golpismo militar

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Brasília – O Supremo Tribunal Federal (STF) começa na próxima terça-feira (2) a julgar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados, entre eles quatro oficiais generais das Forças Armadas, sob acusação de conspiração para subverter a ordem constitucional. Especialistas apontam que, se houver condenação, o país romperá uma tradição de anistiar militares envolvidos em tentativas de golpe desde o fim do século 19.

No banco dos réus estão os generais Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, além do almirante Almir Garnier. A Procuradoria-Geral da República (PGR) sustenta que Braga Netto coordenou as ações mais graves da trama; Heleno alimentou o discurso de desconfiança contra as urnas eletrônicas; Paulo Sérgio aderiu, de forma omissa, ao plano; e Garnier forneceu apoio moral e material à articulação.

Quebra de padrão histórico

A professora Adriana Marques, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), observa que o julgamento destoa de um padrão iniciado em 1889, quando militares protagonizaram o golpe que instituiu a República. “Nunca houve indiciamento de oficiais-generais por tentativa frustrada de golpe. Sempre que processos eram abertos, vinham anistias em seguida”, afirma.

O historiador Carlos Fico, também da UFRJ, lembra episódios como a Revolta da Vacina (1904) e o levante de Jacareacanga (1956), cujos participantes foram perdoados. Para Fico, a diferença agora decorre do fortalecimento institucional promovido pela Constituição de 1988, que ampliou os poderes de investigação da Polícia Federal e consolidou o papel do STF e da PGR.

Impacto nas Forças Armadas

Os pesquisadores entendem que uma eventual punição dos quatro-estrelas — grau máximo na carreira — terá reflexos sobre a percepção de militares a respeito da participação política da caserna. Segundo Adriana Marques, mais de três décadas de democracia contínua criaram um ambiente em que não prosperou a tentativa de ruptura. “Houve resistência de sociedade civil, imprensa e Congresso, e mesmo generais admitiram que ‘não havia clima’ para um golpe”, diz.

O julgamento no STF deverá ser sucedido por processo no Superior Tribunal Militar (STM), responsável por confirmar a perda de posto e patente de oficiais condenados a mais de dois anos de prisão. Dois membros do STM ouvidos pela reportagem admitem que a eventual condenação de generais de quatro estrelas e de um ex-chefe de Estado pode tensionar a corte, que tradicionalmente atua de forma homologatória.

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Possíveis efeitos

Para analistas, a ação penal pode servir de alerta à tropa de que investidas contra a ordem democrática receberão tratamento rigoroso. Ainda assim, a politização das Forças Armadas permanece como desafio de longo prazo.

O resultado do julgamento, inédito em 135 anos de República, será acompanhado com atenção por militares da ativa e da reserva, além de observadores internacionais. Se confirmado o novo paradigma, a tradição de perdão aos fardados envolvidos em insurreições pode ficar definitivamente no passado.

Quer entender mais sobre a relação entre caserna e política? Acesse nossa seção especial de notícias e acompanhe a cobertura completa.

Com informações de Folha de S.Paulo

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