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Empresários defendem negociação e rejeitam retaliações enquanto governo avalia resposta a sanções dos EUA

Uma série de manifestações públicas de líderes do setor privado brasileiro indica resistência à adoção de retaliações comerciais pelo país em reposta às tarifas anunciadas pelos Estados Unidos. Os posicionamentos ganharam relevo após reunião realizada na última terça-feira, em Brasília, entre o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, e representantes de grandes companhias nacionais.

Ao deixar o encontro, dois executivos declararam-se contrários a contramedidas imediatas, defendendo que o governo priorize o diálogo com Washington. O movimento foi reforçado dias depois pelo presidente da Embraer, Francisco Gomes Neto. “Pessoalmente, sou contra. Acho que tem que esgotar primeiro a parte negocial”, afirmou, acrescentando que está otimista quanto a um entendimento que evite uma escalada tarifária.

A Embraer integra a lista de empresas que podem ser diretamente afetadas pelas sanções americanas. Diante desse cenário, o Palácio do Planalto passou a mencionar a possibilidade de impor tarifas de retaliação ou outras restrições a produtos e serviços dos EUA. A sinalização oficial, porém, contrasta com a cautela externada por parte do empresariado, que teme aumento de custos, volatilidade cambial e impacto sobre cadeias produtivas integradas aos mercados norte-americanos.

Embora o governo ainda não tenha detalhado quais setores seriam alvo de contramedidas, a hipótese de sobretaxar plataformas digitais estrangeiras foi citada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em discurso na quinta-feira. A referência às chamadas “big techs” ocorreu em meio a críticas à postura de Washington e foi interpretada como recado de que o Brasil dispõe de instrumentos para responder caso o diálogo não avance.

A tensão bilateral ganhou corpo em maio, quando a Casa Branca notificou Brasília sobre a intenção de elevar tarifas, atribuindo-as a “práticas tarifárias e não tarifárias” brasileiras e a supostos déficits acumulados pelos Estados Unidos no comércio global. No mesmo documento, o ex-presidente Donald Trump, signatário da carta, condicionou o recuo das medidas a que o processo judicial envolvendo o ex-mandatário Jair Bolsonaro fosse encerrado “imediatamente”.

O Ministério das Relações Exteriores enviou resposta pedindo esclarecimentos e contestando os argumentos, mas não recebeu retorno até o momento. Técnicos do Itamaraty e da Secretaria de Comércio Exterior afirmam que, caso não haja evolução nas conversas até o início de agosto, o governo terá de decidir se formaliza retaliações na Organização Mundial do Comércio ou se adota medidas unilaterais.

Para lideranças empresariais, qualquer ação punitiva deve ser precedida de estudo de impacto. Companhias dos segmentos aeronáutico, de agronegócios e de bens de consumo calculam que um ciclo de elevação tarifária pode reduzir receitas e comprometer investimentos planejados para o segundo semestre. Mesmo assim, entidades setoriais admitem que, se as tarifas americanas forem efetivamente implementadas, a pressão por contrapartidas crescerá dentro do próprio setor produtivo.

Interlocutores do Palácio do Planalto reconhecem que a clareza das declarações contrárias às retaliações pode enfraquecer a posição brasileira na mesa de negociação. Segundo esses assessores, a costumaz estratégia de exibir “poder de fogo” ao início de tratativas foi comprometida, pois a percepção pública é de que grandes empresas preferem evitar confronto direto.

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Imagem: redir.folha.com.br

Até o momento, não há registro de que o governo tenha organizado rodadas formais de esclarecimento com executivos para alinhar postura perante Washington. Fontes do Ministério do Desenvolvimento afirmam que encontros reservados poderão ocorrer nas próximas semanas caso o impasse persista.

Enquanto isso, parlamentares de diferentes partidos articulam audiências nas comissões de Relações Exteriores e de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados para discutir os possíveis efeitos das sanções. Congressistas favoráveis a uma resposta firme alegam que a ausência de reação encorajaria novas pressões; opositores argumentam que eventual retaliação ampliaria incertezas em um momento de recuperação econômica ainda frágil.

No setor privado, a divisão é mais nítida entre companhias voltadas ao mercado interno e aquelas com forte exposição a exportações. Enquanto fabricantes de bens de capital veem espaço para diversificar destinos caso as tarifas avancem, empresas de tecnologia e aviação alertam que não conseguem redirecionar vendas no curto prazo, razão pela qual insistem em prolongar a etapa negocial.

O cronograma informal das tratativas indica que representantes dos dois governos devem se reunir novamente em Washington antes do fim de julho. Até lá, o Ministério das Relações Exteriores monitorará os desdobramentos e aguarda instruções do Planalto sobre a manutenção ou não da estratégia de retaliação como instrumento de pressão.

Para os negociadores brasileiros, a coesão interna é vista como fator decisivo. Se prevalecer o entendimento de que o país não utilizará contramedidas, a delegação chegará à capital americana com margem reduzida para barganha. Caso contrário, o governo poderá sustentar que dispõe de respaldo político e empresarial para responder na mesma intensidade às tarifas norte-americanas.

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