Lula e evangélicos: o presidente encara um índice de desaprovação de 62% entre fiéis, segundo o Datafolha, e ainda busca a linguagem adequada para restabelecer pontes com as igrejas que já foram suas aliadas.
Na semana passada, Lula (PT) participou do podcast cristão “Papo de Crente”, apresentado pelo pastor Marco Davi e por Eulália Lemos, ligados à progressista Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito. Ao lado da primeira-dama, Janja, o presidente contestou rumores de que teria intenção de fechar templos e afirmou que “Deus está vendo quem fala a verdade”.
Lula e evangélicos: falta letramento para diálogo
A escolha do programa, porém, evidenciou limitações da estratégia. O público do podcast já rejeita Jair Bolsonaro (PL) e simpatiza com pautas sociais defendidas pelo governo. Fora desse microcosmo, permanece a sensação de que a elite progressista desdenha da fé evangélica, percepção reforçada por anos de polarização e pelo discurso moral conservador presente nos púlpitos.
Analistas lembram que, em setembro de 2025, o Datafolha registrou desaprovação de 62% dos evangélicos a Lula, ante 48% na média da população. Para especialistas, o problema não é apenas eleitoral, mas de comunicação: o presidente fala a língua da política, enquanto líderes rivais ocupam o espaço simbólico da fé.
Nos mandatos anteriores, o petista mantinha interlocução com nomes de peso do meio evangélico. Hoje, sem esses canais contínuos, recorre a iniciativas pontuais e a apoiadores com influência restrita. A base evangélica, majoritariamente negra, feminina e de baixa renda, converge com o lulismo em temas como trabalho e combate à fome, mas espera que valores religiosos sejam reconhecidos sem ironias.
Pesquisadores descrevem essa lacuna como ausência de “letramento evangélico”: compreensão das práticas comunitárias, da teologia popular e das sensibilidades presentes nas periferias. Enquanto isso, adversários consolidados em grandes denominações reforçam a narrativa de que Lula representaria ameaça aos princípios cristãos.
Dentro do Planalto, a avaliação é de que visitar templos não basta. É preciso um plano contínuo de diálogo, que inclua políticas voltadas a demandas sociais específicas dos fiéis e linguagem que respeite a centralidade da fé na organização da vida cotidiana.

No curto prazo, o governo planeja intensificar programas como cozinhas comunitárias e Gás do Povo, citados no podcast, para demonstrar sintonia com passagens bíblicas sobre cuidado aos pobres. Ainda assim, especialistas alertam: sem interlocutores de projeção nacional e narrativa coerente, a rejeição tende a persistir.
Em meio à campanha antecipada de 2026, Lula corre contra o relógio para converter discursos em aproximação concreta. O desafio é combinar agenda social com respeito às convicções religiosas, antes que o terreno permaneça dominado por adversários que falam com fluência a língua dos crentes.
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